Falámos com David Flores, Arquitecto Paisagista com mais de 25 anos de experiência, focado na gestão e coordenação de projectos, desde a fase de concepção até à conclusão da obra. Licenciado pré-Bolonha pela Universidade de Évora e com um Master of Science (MSc) em Design Urbano pela Universidade de Barcelona. Ao longo da sua carreira, integrou equipas de gabinetes de renome nacional e internacional, tendo trabalhado na ARPAS (desde 1999) e na PROAP, foi sócio-gerente da Traços na Paisagem (2007-2013). Actualmente, é BIM Manager e coordenador de projecto na Biodesign – Ambiente e paisagem.
É um membro activo da Associação Portuguesa dos Arquitectos Paisagistas (APAP) desde 2001, tendo desempenhado funções como Vogal do Conselho Fiscal (2017-2020) e Vogal de Direcção (2021-2024).
Qual a importância da arquitectura paisagista na construção de cidades mais habitáveis e de espaços privados mais conscientes?
A arquitectura paisagista é fundamental para a formação de cidades e espaços urbanos mais integrados com a natureza, melhorando a qualidade de vida da população residente e criando espaços ecológicos e sustentáveis. Não se trata apenas de plantar árvores, ou fazer “arranjos de plantas” mas de criar espaços exteriores na sua verdadeira essência. A arquitectura paisagista é uma área do conhecimento que integra a estrutura da cidade com a natureza procurando conciliar aspectos funcionais e ecológicos, tendo um papel crucial para a qualidade de vida e sustentabilidade urbana.
A cidade não deve ser pensada isoladamente, separada da sua matriz natural e dos sistemas que lhe estão associados. Deve existir um conhecimento dos processos ecológicos e das características do local para criar espaços bem-adaptados aos sítios e que respeitem o ambiente, promovam a biodiversidade e ajudem a mitigar os impactos ambientais da urbanização e da concentração humana.
A identidade e memória do lugar deve ser igualmente valorizada integrando as características históricas, culturais e naturais. A paisagem urbana resultante deverá dialogar com a paisagem original e envolvente, preservando a memória e singularidade do território.
A estrutura da cidade deve gerar espaços funcionais, sustentáveis, com sentido de responsabilidade e pertença. O design, desenho associado a uma função, deve ser consciente e dotado de sentido estético integrando-se e participando na concepção do todo.
A participação do arquitecto paisagista deverá ser assegurada desde o primeiro momento, começando pela análise do território onde se insere a área de intervenção. Diagnosticar fragilidades e potencialidades, percebendo a dinâmica natural do sítio, a topografia, o clima, a aptidão do solo, o regime hídrico, a flora, o movimento das massas de ar ao longo dos vales é uma habilitação do arquitecto paisagista. Isto não significa retirar importância da presença do biólogo, do urbanista, do arquitecto ou de outra especialidade técnica. Significa que cada vez mais há necessidade de alargar o conhecimento e estabelecer pontes entre as várias disciplinas do saber, e nesse percurso de visão transversal, holística e sistémica, a arquitectura paisagista foi pioneira. A matriz do território está lá e não deve ser ignorada e tem de ser tratada com conhecimento, sensibilidade, sabedoria e, já agora, bom senso.
A arquitectura paisagista não deve ser um acto isolado, mas sim parte integrante do planeamento urbano. Os espaços verdes apoiados nos sistemas e matriz natural do território devem formar uma rede contínua – estrutura ecológica – conectando territórios, garantindo a permeabilidade e a circulação do ar, da água,… da vida na cidade.
A cidade é mais habitável se existir ar renovado para respirar. Os espaços verdes são essenciais para o bem-estar físico e mental dos cidadãos. Os parques urbanos, os jardins e corredores verdes constituem “pulmões” que proporcionam oportunidades de lazer, convívio social e contacto com a natureza. Ou seja, para o arquitecto paisagista, a cidade deve ser consistente e interligada com um sistema vivo onde a natureza tem um papel estrutural central, e não apenas compositivo ou decorativo.
O espaço privado vem interligado com os espaços públicos, com os jardins, com as hortas e com as alamedas roborizadas, com uma participação activa no todo. Em conjunto desempenham um papel crucial na qualidade da vida das cidades.
Os jardins privados contribuem para o aumento da biodiversidade na cidade, criando uma rede de habitats que possibilita a fixação de flora e fauna suportando também a circulação de espécies e a polinização.
Esses jardins bem projectados possibilitarão a infiltração da água das chuvas no solo ajudando a carregar os lençóis freáticos evitando perdas de água por escorrimento superficial, reduzindo o risco de cheias em áreas urbanas massivamente impermeabilizadas.
A vegetação dos jardins privados, apesar da dimensão que possuam, contribuem para a diminuição da temperatura ambiente, constituem sombras que ajudam a combater o efeito e “ilhas de calor” da cidade. Na sua proximidade o ar será mais fresco e húmido.
Para além dos benefícios ecológicos, a estética e a psicologia também estão presentes. Estes espaços promovem a concepção íntima do homem/natureza, transmitindo tranquilidade e bem-estar, essenciais para a melhoria da qualidade de vida na cidade.
O jardim privado como elemento vital integrado na paisagem urbana, que em conjunto com os espaços públicos forma um tecido vivo e funcional contribuindo para cidades mais saudáveis e resilientes. O compromisso de cada projecto e proprietário em manter o seu jardim de forma ecológica e sustentável é um acto de responsabilidade cívica e ambiental.
Conheça o projecto de paisagismo com assinatura do Arq. David Flores da Biodesign – Ambiente e paisagem e execução do Horto do Campo Grande, de uma habitação unifamiliar no Pestana Tróia Resort, aqui.
© Companhia das Cores para Horto do Campo Grande